quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Sobre a base da pirâmide e Inovação Corporativa

Por Luiz Ros e Ana Luiza Ferreira

Ao falarmos a respeito da iniciativa Oportunidades para a Maioria do BID em palestras, ou até mesmo em reuniões com executivos, não é raro observarmos a dificuldade em distinguir estratégias para a base da pirâmide (ou BoP, por causa da expressão em inglês Base of the Pyramid) de simplesmente vender para as classes C, D, e E. Maior ainda é a confusão entre BoP e Responsabilidade Social Corporativa. Depois de alguns minutos de conversa, no entanto, os rostos estão invariavelmente iluminados e cheios de expectativas e idéias, especialmente quando demonstramos o potencial dos modelos de negócios BoP para a promoção da inovação e alavancagem do crescimento das organizações.

A iniciativa Oportunidades para a Maioria foi lançada pelo BID em julho de 2007, com o objetivo de aumentar a qualidade de vida de comunidades de baixa renda de forma sustentável. O seu mandato prevê a promoção e financiamento de soluções de mercado que envolvam o desenvolvimento e provisão de produtos e serviços de qualidade para a maioria na América Latina, através de modelos e parcerias de longo prazo.

Já prevíamos, naquela época, os desafios que nos esperavam, uma vez que, para promover a inovação, era necessário também inovar. Três anos depois, ficamos orgulhosos ao notar as necessárias transformações internas promovidas para o adequado cumprimento do nosso mandato. Processos de aprovação de projetos redesenhados e uma nova metodologia de análise de risco são dois exemplos das transformações catalisadas internamente.

Os nossos maiores exemplos de inovação, no entanto, estão nos clientes e parceiros da iniciativa. Eles enxergaram que mais valioso que insistir na briga por cada fatia do já saturado mercado das classes média e alta é descobrir formas eficientes de servir com qualidade e alto valor agregado aos 70% da população da América Latina que permanecem com acesso limitado a produtos e serviços básicos.

O processo de enxergar a baixa renda como mercado está avançando a passos rápidos no Brasil. Há, no entanto, distinções a serem feitas. Entender a realidade e necessidades de produtos e serviços da maioria requer um alto grau de esforço. Oferecer produtos de má qualidade ou com condições inaceitáveis para as classes baixas não tem nada a ver com BoP. Estratégias de base da pirâmide estão relacionadas, por exemplo, com inovação para diminuir custos e lucrar no volume, não na margem. São necessárias novas maneiras de operar.

Ao falar em volume, nos vem à cabeça o conceito de plataformas. Percebemos cedo que escala é uma peça essencial para decifrar o código do sucesso na base da pirâmide. Assim, analisamos vários modelos, identificando as plataformas envolvidas. Percebemos que essas plataformas tomam os mais diversos formatos. De sistemas de distribuição de serviços de utilidade pública a armazéns de construção. De redes de vendedoras porta-a-porta a programas governamentais de transferência condicional de renda. Todas essas plataformas tem potencial para viabilizar alcançar os indivíduos de baixa renda com alto volume e custos reduzidos.

Um belo exemplo é o projeto "Financiamento Social", das Empresas Públicas de Medellín (EPM), uma das maiores corporações da Colômbia que oferece serviços de gás, água e eletricidade, entre outros. A maioria dos clientes da EPM vive em áreas de muito baixa renda, sem acesso a oportunidades. Na Colômbia, 45% da população adulta não tem acesso a quaisquer serviços financeiros formais. Em Medellín, menos de 25% dos moradores tem acesso a cartões de crédito ou empréstimos. Os bancos comerciais não atendem a essa população pela percepção de que é altamente arriscado emprestar para a baixa renda. Como eles não têm histórico creditício comprovado, é muito caro emprestar através dos sistemas financeiros tradicionais. A EPM percebeu, então, que os registros das contas desses clientes tem um alto potencial transformador. Eles apontam para a capacidade financeira e evidenciam os clientes que pagam suas contas em dia. Dessa forma, resolveu montar uma operação para fornecer também crédito, de maneira responsável. O crédito não pode ser utilizado para qualquer fim, está vinculado à compra de bens que elevarão o padrão de qualidade de vida das famílias, como materiais de construção, refrigeradores, aquecedores, lavadoras, etc. O melhor: os registros de crédito desses indivíduos de baixa renda são repassados ao bureau de crédito nacional. Eles passam, assim, a construir seu histórico creditício e a poder acessar, num futuro próximo, canais formais de crédito com condições mais vantajosas.

A exemplo do crédito, precisamos inovar em outras áreas. Ainda não há, por exemplo, a opção de educação básica de alta qualidade amplamente acessível às camadas mais baixas. Atenção, aqui não nos referimos, de maneira alguma, à substituição do governo pelo setor privado. A questão é que os desafios para o desenvolvimento integral das comunidades de baixa renda são tão amplos e complexos que demandam as características de alto dinamismo e apetite constante para a inovação, tornando valiosa a parceria com o setor privado. Há uma grande oportunidade para a construção de parcerias público-privadas.

O BID, Banco Interamericano de Desenvolvimento, está numa posição estratégica para apoiar empresas que almejam servir aos mercados da maioria, por combinar expertise na área de produtos financeiros e de assistência técnica e atuar em pesquisa, políticas públicas e junto ao setor privado. A grande aposta desta iniciativa está na busca de soluções para os graves problemas sociais a partir das ferramentas de um setor privado criativo, inovador e sustentável. Todos saem ganhando.

*A opinião dos autores não reflete, necessariamente, a posição do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Fonte: Next Billion Brasil

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