sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Economia verde, limpa e inclusiva: novo paradigma de sustentabilidade

José Eustáquio Diniz Alves*, para o EcoDebate

Entre 1800 e 2010 a população mundial cresceu cerca de 7 vezes (passando, aproximadamente, de um para sete bilhões de habitantes) e a economia do mundo cresceu algo em torno de 50 vezes. As megacidades cresceram num ritmo ainda maior. A esperança de vida ao nascer da população mundial girava em torno de 30 anos e agora está próxima de 70 anos. A despeito das desigualdades sociais, na média, as pessoas estão mais ricas e vivendo mais tempo, com mais educação, melhores condições de moradia e mais acesso aos bens de consumo. Existem quase um bilhão de pessoas em situação de insegurança alimentar (ou desnutridas), mas existe um número muito maior de pessoas acima do peso ou com graves problemas de obesidade.

Isto quer dizer que o modelo de desenvolvimento industrial teve “sucesso” em promover o “progresso”, elevando o acesso a bens de consumo para a maioria dos sete bilhões de habitantes do mundo, embora as condições de vida sejam muito diferenciadas nacional e internacionalmente.

A chave do crescimento econômico foi o uso indiscrimado da energia fóssil (carvão vegetal, carvão mineral, gás e petróleo) acumulada na natureza durante milhões de anos, além do uso da riqueza vegetal de florestas e matas, do aproveitamento do manancial das nascentes de água, dos rios e lagos e da utilização da riqueza da vida marinha. Mas tudo isto às custas da degradação das condições ambientais e da pauperização do Planeta.

Nos clássicos do pensamento econômico, o meio ambiente é uma externalidade que só afeta a dinâmica econômica por meio da elevação dos preços. A ciência econômica sabe que “as necessidades e as expectativas humanas são ilimitadas e os recursos são finitos”. Por isto, existem diversos tratados sobre a lei dos rendimentos decrescentes e sobre o “estado estacionário”. Mas, em geral, a economia não se preocupa com o começo ou o fim dos tempos e sim com o fluxo de produção e consumo. Os modelos clássicos da economia trabalham com 4 preços fundamentais: salário (preço do trabalho), juro (preço do dinheiro), câmbio (preço das divisas) e inflação (preço dos bens e serviços). Estes preços ajudam na determinação da renda da terra, do lucro do capital e do aluguel de móveis e imóveis.

A ciência econômica está muito centrada no curto prazo e na maximização dos recursos produtivos do momento. Curto prazo é o período em que os fatores de produção são dados. A macroeconômia, por exemplo, se preocupa em fazer coincidir o produto real com o produto potencial, administrando as metas de inflação, o valor do salário mínimo, os juros, o câmbio, as taxas de investimento, etc. O futuro não importa muito pois é apenas o somatório de infinitos “curtos prazos”. Como dissia John Maynard Keynes: “no longo prazo todos estaremos mortos”. Só não sabia que o “longo prazo” já esta à vista no horizonte. Os limites da Terra já podem ser vistos a cada catastrófe ambiental que tem acontecido.

O modelo econômico desenvolvimentista e consumista (quer seja dos EUA, da Rússia ou da China), chegou a uma encruzilhada, pois não levou em devida consideração os custos da externalidade ambiental. O uso generalizado e indiscriminado da energia fóssil não incorporou os danos da poluição ambiental, do aquecimento global e o esgotamento das reservas. Também não levou em consideração a sobreutilização dos aquíferos, da pesca, dos minerais raros, etc.

Não há como manter o crescimento econômico no ritmo dos últimos 60 anos (desde o II pós-guerra) sem provocar um catastrófe ecológica nos próximos 60 anos, pois um crescimento anual de 3,5% ao ano significa que o PIB mundial dobraria a cada 20 anos e multiplicaria por 8 até 2070. Não há como manter a exploração predatória por tal quantidade, em tal tempo.

Também não se trata apenas de conciliar desenvolvimento com sustentabilidade ambiental. O “buraco é mais embaixo”, isto é, trata-se de eliminar o conflito entre duas dinâmicas em permanente oposição. A lógica do desenvolvimentismo é oposta à lógica da ecologia. O desenvolvimentismo utiliza as demandas dos direitos humanos e das necessidades da população para justificar os crimes ambientais. Mas os seres humanos não são os únicos habitantes da Terra e as gerações presentes não podem e nem deveriam comprometer o futuro dos seus descendentes.

O que o mundo precisa no século XXI é um modelo econômico que corrija as injustiças sociais, garantindo a prosperidade e a qualidade de vida da humanidade, ao mesmo tempo que incrementa a biodiversidade, protege e recupera os recusos naturais do Planeta. A população não pode fazer simplesmente o que quer sem pensar nos demais seres vivos da Terra. O mercado não pode agir simplesmente na lei da oferta e da procura, com a lógica do curto prazo. O consumo desenfreado não é um direito que está acima do bem comum do ecossistema. O capital privado não pode estar acima do capital natural e público. O governo não deveria ser um espaço para a reeleição de políticos corruptos, mas a instância capaz de unificar os esforços para compatibilizar o presente com o futuro de maneira sustentável.

O que o mundo precisa é de um modelo econômico que incorpore população, desenvolvimento social e incremento (e não redução) das fontes de vida da Terra. Mais intuição e menos destruição. É preciso romper o choque entre economia e meio ambiente, pois não se trata de incentivar a demofobia e nem promover a consumofobia. Porém, é preciso cobrar caro pelo desrespeito ambiental e taxar os danos ao ecossistema.

O conceito de Economia Verde e Inclusiva busca pensar nesta direção. Muito falta ser feito e pensado. Mas como escrevi em outro artigo, podemos considerar um novo paradigma de sustentabilidade a partir da idéia de uma economia verde, limpa e socialmente justa:

“A economia verde e inclusiva é uma nova forma de organizar as atividades produtivas, que possibilita a melhoria do bem-estar da humanidade e a redução das desigualdades sociais, ao mesmo tempo que evita expor a bioesfera e as gerações futuras a significativos riscos ambientais e de escassez ecológica. Refere-se ao processo de reconfiguração das atividades econômicas e de infra-estrutura para oferecer melhor retorno sobre os investimentos de capital natural, humano e econômico, enquanto reduz as emissões dos gases de efeito estufa, utiliza menos recursos naturais, gera menos resíduos e possibilita a reciclagem do lixo, a universalização do saneamento básico e o reaproveitamento de matérias-primas e produtos manufaturados. Significa uma economia que faz mais com menos e utiliza menor quantidade de bens materiais e maior quantidade de bens e serviços imateriais e intangíveis. A economia verde implica a reconstituição das florestas, a defesa da biodiversidade, a promoção da agricultuta sustentável, da aquacultura e dos recursos hídricos, assim como o planejamento urbano e a promoção de transporte e prédios sustentáveis. É uma economia que incentiva e articula a sociedade do conhecimento com o desenvolvimento sustentável, a criação de empregos verdes com o decrescimento das atividades poluidoras e possibilita o crescimento de novas oportunidades de renda, menor consumismo e maior inclusão social”.

*José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE;

As opiniões deste artigo são do autor e não refletem necessariamente aquelas da instituição

Fonte: Mercado Ético / EcoDebate

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