Por Supachai Panitchpakdi*
Genebra, Suíça, setembro/2010 – A década passada foi um período de otimismo para os países em desenvolvimento e seus sócios quanto ao progresso. As taxas de crescimento econômico alcançaram altos níveis em muitas regiões, mais de 5% na áfrica subsaariana – por exemplo – e, depois de uma década em ponto morto, os fluxos de ajuda começaram a aumentar. A iniciativa dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) para enfrentar a pobreza e os desafios para o desenvolvimento por meio de uma série de metas acordadas internacionalmente certamente galvanizou, então, o apoio dos países doadores.
Desde a recente crise financeira, entretanto, o crescimento econômico retrocedeu. O impacto foi severo, não só nos países com grande necessidade de ajuda como também nas nações doadoras, que sofrem uma crescente pressão fiscal para reduzir seus orçamentos de ajuda. De modo que as perspectivas de alcançar os ODM até 2015 parecem mais débeis do que nunca.
A perspectiva é especialmente sombria para o ODM 1, sobre redução pela metade do número de pessoas em extrema pobreza. Inclusive antes do impacto da crise, o rápido crescimento econômico havia fracassado em deter a crescente desigualdade, que está frequentemente associada com a pobreza. A geração de emprego é o principal mecanismo para reduzir a pobreza, as sociedades se tornam mais igualitárias e o crescimento econômico pode ser sustentado. O aumento da parte dos lucros da produtividade que cabe aos trabalhadores será um modo de distribuir com mais justiça os benefícios da globalização.
Nos últimos 40 anos de rápida globalização, a crença de que os baixos salários são um fator fundamental da competitividade internacional dominou as políticas econômicas. O crescimento conduzido pela exportação foi um marco dessa era, que infundiu a crença de que os salários devem ser descarnados até o osso, para preservar as duramente alcançadas vantagens competitivas no comércio internacional. Contra esse pano de fundo, foram introduzidos fundamentalmente os ODM, para fazer frente às consequências sociais dos baixos salários, do desemprego e da pobreza.
Algumas economias, como a da China, não se caracterizam apenas pelo trabalho, mas também pela alta tecnologia, resultante de elevados investimentos estrangeiros e de transferência de tecnologia. Os benefícios da produtividade procedem tanto do trabalho barato como dos investimentos, o que melhorou a vida de milhões de chineses e gerou um amplo superávit comercial. Entretanto, os ganhos de produtividade obtidos pela China também beneficiam países desenvolvidos, às vezes à custa de seu próprio povo.
As economias europeia e norte-americana recolheram os despojos da produtividade chinesa por meio de importações baratas, enquanto os trabalhadores chineses poderiam ter se beneficiado mais do modelo de economia exportadora se não tivessem sofrido uma queda nos salários reais.
Uma estratégia de crescimento baseada nas exportações não é possível para todos os países, por uma série de razões. Entre elas está o lógico corolário de que nem todos podem ser exportadores, já que alguns países devem ser importadores de bens e serviços. São estes últimos os que garantiram a demanda global na década passada, junto com a demanda por matérias-primas, que forneceram insumos para as manufaturas exportadas.
Em nível nacional, as políticas tendentes a aumentar os salários e estimular o consumo podem ajudar a manter a demanda e o emprego, fator primordial para conseguir a redução sustentável da pobreza, contemplada no ODM 1. Internacionalmente, o aumento da demanda de importações desses países – e aqui me refiro especificamente a China e outras nações asiáticas – pode também ajudar a reequilibrar as enormes assimetrias em reservas estrangeiras.
A atual retirada de aproximadamente US$ 7 bilhões da economia mundial, que está sendo usada como forma de autogarantia em matéria de reservas em divisas, representa uma gigantesca queda da demanda para a economia mundial e para os países em desenvolvimento, em particular, precisamente quando é mais necessária. Reequilibrar a tendência de reservas, junto com o crescimento salarial, são duas áreas que poderiam ter um imediato mas sustentável impacto na demanda e, finalmente, na redução da pobreza.
A resposta correta nas atuais condições econômicas mundiais, portanto, não é congelar ou reduzir salários ou aumentar impostos, que castigariam os mais vulneráveis, mas investir no crescimento, particularmente por meio de estímulos fiscais e investimentos em capacidades produtivas. Envolverde/IPS
* Supachai Panitchpakdi é secretário-geral da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad).
(IPS/Envolverde)
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