segunda-feira, 3 de maio de 2010

Inclusão racial: o calcanhar de Aquiles das empresas brasileiras

Quando esteve no Brasil, no ano passado, a secretária de Estado Hillary Clinton, dos EUA, pediu para se reunir com os presidentes das maiores empresas norte-americanas atuando no Brasil. Mal terminadas as apresentações, ela disparou uma pergunta: quantas empresas aqui presentes possuem dez negros em cargos de gerência? Ninguém se pronunciou. Assustada, ela refez a pergunta: Então, quantos têm cinco gerentes ou diretores? Novamente, nenhuma manifestação. Estupefata, ela indaga: Então, pelo amor de Deus, quem tem pelo menos um negro em qualquer cargo de chefia? E o silêncio continuou sendo a resposta. Esquecendo o protocolo, Hillary Clinton pôs o dedo na ferida: Pois então, os senhores façam o favor de copiar as matrizes e começar a contratar negros brasileiros para dividir as decisões e o poder com vocês!

Esta história é contada por José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, a Unipalmares. Esta instituição é a pioneira e, até agora, única universidade brasileira idealizada e gerida por negros, para oferecer ensino superior de qualidade para estudantes negros e pobres, sem barreiras para a entrada de alunos brancos. Seus idealizadores resolveram encarar de frente o principal argumento das empresas para não contratar negros, principalmente para cargos executivos: falta de formação adequada.

Fundada em 2003, a Unipalmares conta hoje com 1600 alunos, 90% deles negros autodeclarados que estudam por meio de bolsas custeadas por empresas e por programas de governos, como o Prouni. Oferece cinco cursos superiores: Administração, Direito, Tecnologia em Transportes, Pedagogia e Publicidade & Propaganda. Os mais procurados são Administração e Direito, sendo que o curso de Administração foi recentemente avaliado com 3 estrelas (cotação máxima) pelo Guia do Estudante da Editora Abril.

A Unipalmares já formou 600 profissionais, dos quais 300 foram contratados pelos bancos e empresas onde fizeram estágio. Alguns deles já foram promovidos e podem, dentro de cinco anos, melhorar a estatística destas empresas no que tange à participação dos negros em cargos de chefia. Os grandes parceiros desta empreitada têm sido os bancos Bradesco, Itaú, Santander, HSBC; empresas de outros segmentos fizeram parceria mais recentemente e já estão oferecendo estágio aos estudantes da Unipalmares, como a Ford, a Mercedes Benz, a construtora W Torre e o Carrefour.

A Unipalmares criou um fato novo no ambiente empresarial brasileiro, ao provar que o jovem negro pode ter um desempenho escolar igual ou superior a qualquer outro jovem. As empresas é que estão andando devagar. Por que tão poucas informam que estão buscando a inclusão racial e, mais ainda, adotando políticas específicas para atingir este objetivo?

Todas as empresas precisam participar deste esforço, não há desculpa para não fazê-lo. Qual é este esforço? O da inclusão racial em todos os níveis hierárquicos, mas, principalmente, em cargos de chefia.

Se temos orgulho de nossa diversidade étnica e cultura, não podemos mais suportar que o perfil das empresas que detêm os melhores empregos continue sendo branco, masculino e até 45 anos.

Na edição de 2007 do “Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 Maiores Empresas do Brasil”, realizado a cada dois anos pelo Instituto Ethos e pelo Ibope, a inclusão racial não apresentou nenhum avanço significativo. Os negros representam, hoje, 49,6% da população brasileira, de acordo com o IBGE. De acordo com o Dieese, os negros representam 46,6% da população economicamente ativa e 44% da população ocupada. No entanto, conforme mostra o Perfil do Ethos-Ibope de 2007, nas maiores empresas, ocupam 25% dos cargos funcionais (“chão de fábrica”), 17,5% daqueles de supervisão; 17% de gerência; e 3,5%, nos postos executivos.

A situação da mulher negra é ainda pior. Elas representam 7,4% do quadro funcional, 5,7% da supervisão; 3,5% de gerência; e 0,26% de diretoria. Traduzindo em miúdos, temos o seguinte: dos 1518 diretores cuja cor ou raça foi informada, apenas 4 eram negras.

O desafio da inclusão racial nas empresas está lançado. E desta vez, não tem a desculpa de que falta formação.

Um comentário:

  1. Estuvimos haciendo la cobertura de la Conferencia de Ethos en 2007, en San Pablo y con el grupo de periodistas coincidiamos en remarcar la poca presencia de la población afroamericana entre los asistentes y los panelistas de la Conferencia.
    Entendemos que es una línea de trabajo y un desafío muy importante para el Instituto. Cuenten con nosotros para acompañarlos! Saludos!

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