sexta-feira, 12 de março de 2010

Responsabilidade Social Empresarial e Política Nacional de Resíduos Sólidos

Depois de quase vinte anos de luta da sociedade civil, um substitutivo ao projeto de lei 203 / 91 que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos foi aprovado esta semana na Câmara Federal. Trata-se de uma vitória que deve ser comemorada por todos os setores que se mobilizaram por mais de uma década em favor da medida. No entanto, ainda existem percalços a vencer.

Vamos comentar o lado bom da Lei 203 / 91. Sérgio Abranches, em seu comentário de hoje pela manhã na CBN, ressaltou muito bem os aspecto positivos desta lei: ela é abrangente e contemporânea, porque abarca, em seu texto, todos os aspectos do tema, inclusive modernos conceitos de gestão, como ciclo de vida do produto e logística reversa.

O grande avanço deste substitutivo é que ele estabelece a responsabilidade compartilhada na destinação dos resíduos. Isto significa que cada integrante da cadeia produtiva – fabricantes, fornecedores, distribuidores e consumidores são responsáveis pelo manejo adequado dos resíduos, fazendo-os retornar ao processo produtivo (logística reversa) ou dando-lhes destinação final que não seja a deposição em aterros sanitários.

No caso específico de pilhas, baterias e eletroeletrônicos, a lei prevê obrigações para todas as partes. Os consumidores individuais, por exemplo, deverão devolver estes materiais aos comerciantes que irão encaminhá-los à indústria. Esta, por sua vez, será responsável pelo “desmonte” do produto nas matérias-primas originais, para reaproveitamento, ou descarte em local adequado.

Se a Prefeitura fizer este trabalho, deverá ser remunerada por isto. O que significa que estes materiais não poderão mais ser “jogados fora” junto com o lixo doméstico.

As empresas de uma determinada cadeia produtiva também deverão consolidar processos de recebimento de embalagens e produtos pós-uso pelo consumidor: agrotóxicos, pneus, óleos lubrificantes, papelão, plástico, isopor e lâmpadas.

Isto é logística reversa, já em uso por pelos menos duas cadeias de varejo: Casas Bahia e Submarino. Quando a compra do eletrodoméstico ou eletroeletrônico é entregue ao consumidor, os funcionários que fazem a entrega desembalam o produto, testam-no e depois levam todas as embalagens: plástico, isopor, estrado de madeira, caixa de papelão. Estes materiais são encaminhados para as centrais de distribuição das empresas, onde cooperativas de catadores fazem a triagem e encaminham para a reciclagem ou reuso, conforme o caso.

O substitutivo aprovado na Câmara também define a prioridade ao trabalho das cooperativas de catadores neste serviço, e a obrigatoriedade de os consumidores acondicionarem em separado os resíduos sólidos gerados e deles se descartarem em lugares adequados.

No caso dos resíduos domésticos, como pet, latas, plásticos, papel e embalagens longa vida, se a Prefeitura assumir o serviço de coleta, o consumidor terá a obrigação de acondicionar e depositar na lixeira corretamente, em separado dos resíduos orgânicos.

Para entrar em vigência, o Programa Nacional de Resíduos Sólidos ainda precisa passar pelo Senado e pela sanção da Presidência da República. Por tradição, são duas etapas que não costumam demorar tanto. A partir daí, vai começar a batalha pela regulamentação das diversas etapas da lei.

O chamado “lobby sujo”, composto por segmentos que não querem a logística reversa, já está a pleno vapor. Aqui em São Paulo, por exemplo, vem estimulando o uso destes resíduos para geração de energia pela queima deles em usinas termelétricas. Além de representarem o que há de mais obsoleto em termos de geração de energia, as termelétricas são caras e ineficientes. A construção de uma só delas vai consumir 250 milhões de dólares e vai conseguir queimar apenas 2 mil toneladas /dia de resíduos. São Paulo produz 10 mil toneladas por dia de resíduos sólidos. O uso destes materiais para gerar energia também vai impedir o desenvolvimento e a consolidação das cooperativas de catadores como alternativa de inclusão social com geração de trabalho e renda. Isto porque os materiais mais valiosos financeiramente para os catadores são justamente os que produzem mais calor, como papelão e alumínio. Se os catadores não conseguem se firmar como categoria profissional, a cadeia produtiva que depende desta coleta também não se consolida, o que compromete também a organização da logística reversa e o surgimento de milhares de oportunidades de negócios e de empregos “verdes”.

O texto do substitutivo tampouco menciona a concessão de incentivos fiscais e incentivos de crédito à indústria da reciclagem. O governo federal vem acenando com isenção de IPI para aquisições de cooperativas. Mas a indústria da reciclagem vai muito além da coleta dos resíduos e precisa deste “empurrão” fiscal para firmar-se.

Enfim, são pontos que ainda podem entrar na lei via Senado – que seria muito melhor. Deixar para a regulamentação pode atrasar ainda mais a solução dos problemas. E, é bom lembrar, a natureza já está mandando a conta por tanto descuido e ganância – lembrem-se das enchentes em nossa cidade.

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