terça-feira, 27 de abril de 2010

Recomenda-se não respirar

O que pode fazer um cidadão paulistano para não morrer de doenças respiratórias por causa do ar da capital? Parar de respirar. Como isso não é possível, será preciso mudar de cidade ou morrer aos poucos. A manchete da Folha de São Paulo do último sábado não deixa dúvidas sobre a qualidade do ar que os milhões de moradores da capital e da grande SP inalam: ela piorou no primeiro trimestre de 2010, por causa do ozônio, gerado na queima do combustível dos milhões de veículos que transitam por nossas vias.

A presença deste gás na atmosfera vinha diminuindo desde 2006, mas voltou a aumentar nos primeiros três meses deste ano. De acordo com a medição da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), divulgada pela Folha no sábado, a qualidade do ar só foi boa em São Paulo em 17 dos 90 dias do trimestre. Nos outros 73, oscilou entre má, inadequada e regular, classificações que põem em risco a saúde da população.

Na opinião dos especialistas, o aumento do ozônio ocorreu por dois fatores principais: o crescimento da frota automotiva, principalmente de motos e veículos de passeio, e de variação climática natural. Dois eufemismos para amenizar a omissão dos poderes públicos e das empresas em relação à saúde pública.

Talvez mais do que outra cidade do mundo, São Paulo vive no limite de seus recursos. No que tange ao transporte, a situação é trágica. São Paulo e região metropolitana não têm vias suficientes para comportar os mais de seis milhões de veículos, quase um veículo para cada dois habitantes. O trânsito ainda flui porque apenas 30% da frota de carros de passeio circulam por dia. Se todos os proprietários de carros, motos, vans, caminhões e camionetes resolvessem sair de casa no mesmo dia, a cidade pararia num imenso congestionamento. E se neste dia ocorresse o fenômeno da inversão térmica, poderíamos morrer sufocados pelos gases poluentes que não se dissiparam na atmosfera.

Da parte do poder público, adotar soluções rápidas que incentivem o transporte coletivo é uma saída para a situação – gratuidade das passagens, ônibus mais confortáveis e em maior número são exemplos destas soluções.

Outro ponto fundamental para enfrentar a poluição é intensificar a inspeção veicular. De acordo com a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da cidade de São Paulo, em 2009, a inspeção veicular teve adesão geral de 78%. Mas esta “média” esconde um fato relevante para a saúde pública: entre a frota que circula pela sociedade, só a de carros de passeio aderiu em 100% à inspeção veicular; nos outros segmentos, passaram pela inspeção apenas 35% das motos, 50% dos veículos leves a diesel e dos caminhões, bem como 75% dos ônibus. E estes são os veículos que mais poluem, seja porque não possuem os dispositivos antipoluição já encontrados nos carros de passeio, seja porque usam o diesel ainda “sujo”. São estes, também, os veículos que mais poluem, porque a circulação mais aumenta.

Enfrentar o problema exige a parceria entre a sociedade, as empresas e o poder público. As montadoras podem adotar tecnologias antipoluição nos veículos de qualquer tipo. As empresas de petróleo e gás podem fabricar um combustível mais limpo com urgência. Estas são questões centrais de responsabilidade social da empresa.

Os governos precisam intensificar o esforço de inspeção veicular e de regulação para impedir que aumente a poluição atmosférica.

A sociedade precisa mobilizar-se para proteger a saúde dos cidadãos. Que tal manifestar-se contra o projeto de lei do Senado 665/2007 que permite a venda de carros a diesel? Atualmente, o uso do combustível apenas em veículos pesados e utilitários é suficiente para matar 6 pessoas por dia, somente na capital paulista, e gerar custos de R$ 82,6 milhões com internações hospitalares pelo Sistema Único de Saúde (SUS), na Região Metropolitana de São Paulo. Não se trata simplesmente de uma manifestação contrária ao carro a diesel, mas, a favor da preservação ambiental e da saúde pública.

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