Relatório da ONU Mulheres demonstra que os países campeões em desigualdade de gênero têm baixo índice de desenvolvimento humano.
A ONU Mulheres, entidade da ONU dedicada à promoção da igualdade de gênero e ao empoderamento das mulheres, lançou há duas semanas seu primeiro relatório global: O Progresso das Mulheres no Mundo: em Busca da Justiça. O documento demonstra que a persistência das desigualdades entre gêneros é o maior entrave ao desenvolvimento humano nos países. Essa desigualdade, segundo a ONU, chega a provocar perdas de até 85% no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Em que pesem os avanços obtidos no século XX, a ONU considera que as mulheres continuam sendo discriminadas em todo o mundo. Eis algumas desigualdades de gênero apontadas pela ONU como responsáveis pelo baixo índice de desenvolvimento humano dos países.
No local de trabalho:
• Em 117 países há leis sobre igualdade de remuneração. Na prática, entretanto, as mulheres ainda ganham até 30% a menos que os homens em alguns deles. As mulheres também realizam uma quantidade maior de trabalho doméstico e não remunerado em todas as regiões;
• No mundo, 53% das mulheres trabalhadoras (600 milhões no total) estão em empregos precários, como o trabalho autônomo ou não remunerado em empresas familiares. Geralmente, elas não contam com a proteção das leis trabalhistas.
Na vida política e pública:
• Existem fortes evidências de que, em países como Ruanda, Nepal e Espanha, uma maior presença feminina no parlamento acelera as reformas para os direitos das mulheres. Contudo, a proporção de mulheres nesses espaços ainda é inferior a 30% na maioria dos países.
O relatório assinala que as leis, quando empregadas adequadamente, estabelecem as bases para a mudança de atitudes e da situação da mulher na sociedade. Segundo o texto, foram registrados progressos graças aos esforços dos indivíduos, da sociedade civil e dos governos para o empoderamento econômico e político das mulheres. Mudanças nas legislações, incluindo as garantias de igualdade de remuneração e a adoção de cotas parlamentares, garantem que as mulheres conheçam seus direitos e possam exigi-los.
Há casos históricos que têm acelerado a reforma de leis e a mudança de atitude em relação às mulheres. Como o ocorrido com a biofarmacêutica brasileira Maria da Penha Maia, que sofreu duas tentativas de assassinato por seu marido, o professor universitário Marco Antônio Herredia – a primeira por arma de fogo, que a deixou paraplégica, e a segunda por eletrocução e afogamento. Ela levou o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos, o que resultou na adoção de uma legislação mais forte no Brasil contra a violência doméstica, simbolicamente chamada de Lei Maria da Penha.
Outro exemplo é o de Unity Dow, ativista pelos direitos humanos de Botsuana e primeira mulher a exercer a função de juíza em seu país. Unit pediu autorização para transmitir sua cidadania aos filhos, cujo pai era estrangeiro. Ganhou a ação e, desde então, pelo menos 20 países africanos reformularam suas leis para permitir que mulheres passem sua cidadania para os filhos.
Contexto nacional
A aplicação da Lei Maria da Penha pela Justiça brasileira tem promovido a diminuição dos casos de violência contra a mulher? Ainda é cedo para avaliar, porque a mudança de comportamento (e de mentalidade) leva mais tempo para ocorrer. De qualquer forma, é correto afirmar que a situação da mulher no Brasil vem melhorando, embora ainda haja muito a avançar. A eleição de uma presidenta, por exemplo, tem causado impacto nas empresas.
Há algumas semanas, o Jornal da Tarde, de São Paulo, noticiou que se ampliou a oferta de vagas gerenciais para mulheres acima de 40 anos, decorrência de um possível “efeito Dilma” no mercado de trabalho. Isso significará que as mulheres terão a mesma representação que os homens nos cargos? Receberão, pelo mesmo trabalho, salários iguais? Ainda não é possível medir esse impacto.
Pelo relatório da ONU Mulheres sobre igualdade de gênero, o Brasil ocupa o octogésimo lugar entre 138 países pesquisados. A nota brasileira é 0,631 (quanto mais perto de 1, pior o desempenho). Isso significa que o crescimento econômico ainda não se traduziu em oportunidades para as mulheres, não só no mercado de trabalho, mas no acesso a serviços públicos de qualidade.
É importante ressaltar que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres possuem escolaridade maior do que a dos homens. Nem assim, todavia, aparecem as chances de melhoria via trabalho e renda. Não por acaso, o foco dos programas sociais dos governos tem sido a mulher. Também não é à toa que as discussões sobre desenvolvimento sustentável destacam a prioridade que deve ser dada às questões de gênero.
Rio+20
Essa prioridade poderá ser traduzida em propostas do país para a Rio+20, a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável que vai se realizar no Rio de Janeiro, no ano que vem. É chave para o Brasil alcançar a igualdade de gênero, porque dessa igualdade depende a superação da miséria e depende também a construção de um país com oportunidades para todos.
A Rio+20 está cercada de expectativas positivas. Governos e sociedade civil esperam que essa conferência estabeleça diretrizes que alavanquem o desenvolvimento sustentável. Numa reunião preparatória ao encontro, realizada em janeiro, na sede da ONU, os presentes apontaram o maior empoderamento das mulheres como fator de avanço do desenvolvimento sustentável. O risco é que esse empoderamento não se reflita em maior participação da mulher na política em geral e, de maneira específica, na construção de um modelo de desenvolvimento que atenda as demandas de igualdade e justiça para as mulheres.
Assim, a sociedade brasileira e as organizações que lutam pelos direitos das mulheres têm a chance histórica de colocar o “feminino” como eixo fundamental da conferência.
Por Jorge Abrahão, Cristina Spera e Benjamin S. Gonçalves (Instituto Ethos)
quarta-feira, 27 de julho de 2011
Igualdade de gênero é base do desenvolvimento sustentável
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