segunda-feira, 19 de março de 2012

Delação premiada para empresa corruptora?

Por Paulo Itacarambi, vice-presidente do Instituto Ethos

Ainda repercute na opinião pública a reportagem deste domingo (18/3), no programa Fantástico, da Rede Globo, na qual um repórter, fazendo-se passar por funcionário administrativo de um hospital público, recebe fornecedores de equipamentos para uma licitação de emergência. Ele recebeu propostas de suborno ao vivo.

O cidadão ou cidadã que assistiu ao programa deve estar se perguntando se dá para controlar essa corrupção. O empresário honesto e ético também não gostou do que viu. Afinal, o mercado não pode funcionar na base do “ou paga propina ou não vende”, pois, além de ilegal, essa prática acaba com a livre concorrência, o “coração” dos negócios.

Dá para controlar a corrupção, sim. Mas o Estado, a empresa e a sociedade precisam agir com maior efetividade para combater o problema.De que forma?
1. Aumentando e melhorando o controle e a fiscalização do Estado;
2. Melhorando os procedimentos da empresa para evitar e prevenir a corrupção;
3. Ampliando o controle da sociedade sobre as empresas e os órgãos públicos, com maior transparência.

O Projeto de Lei 6826, que prevê a aprovação da Lei de Responsabilização Civil da Pessoa Jurídica, também chamada de Lei Anticorrupção, ajuda a desenvolver essas três iniciativas porque:
- estabelece punição para a empresa, inclusive para companhias brasileiras que atuem fora do país, as quais não são responsabilizadas na legislação atual;
- separa a responsabilidade administrativa da responsabilização judicial, o que permite a adoção, por parte do Estado, de medidas como colocação no cadastro de empresas inidôneas e suspensão de acesso a créditos públicos e a licitações, bem como a aplicação de multas;
- com medidas administrativas imediatas e medidas judiciais mais duras, induz a empresa a estabelecer procedimentos mais rígidos;
- uma vez que obriga a manter atualizado o cadastro de empresas inidôneas, aumenta a transparência, a empresa que corrompeu não “some” e a sociedade pode pressionar.

Mais sobre o PL 6826

A aprovação do PL 6826 torna-se mais imprescindível a cada novo caso de corrupção que ganha destaque na mídia. Atualmente, a punição para empresas que cometem ilegalidades ocorre apenas depois do julgamento dos processos. Medidas punitivas imediatas recaem apenas sobre as pessoas físicas.

O PL 6826 estatui que as empresas terão responsabilidade sobre atos contra a administração. Isto quer dizer que o Estado não precisará comprovar a “intenção” de lesar. Basta mostrar que existe uma ligação entre a ação e o resultado dela. Na prática, quer dizer o seguinte: se uma empresa – e seu representante - é pega no ato de pagar suborno a um agente público, ela já será punida, cabendo provar ou não a “intenção” no processo judicial.

Em caso de condenação, as penas são mais duras, podendo, conforme o caso:
- atingir o patrimônio das pessoas jurídicas e obter ressarcimento por atos fraudulentos contra a administração pública;
- responsabilizar objetivamente a pessoa jurídica, afastando a discussão subjetiva sobre a culpa do agente na prática da infração;
- incluir a proteção à administração pública estrangeira, em decorrência dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em relação ao combate à corrupção, ao ratificar a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (ONU), a Convenção Interamericana de Combate à Corrupção (OEA) e a Convenção sobre Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Ao assinar essas três convenções, o Brasil obrigou-se a punir de forma efetiva as pessoas jurídicas que praticam atos de corrupção. Por isso, é urgente e inadiável introduzir no ordenamento nacional a regulamentação da matéria. Em 2002, houve uma alteração do Código Penal que tipificou a corrupção ativa no comércio internacional, mas não atinge as pessoas jurídicas eventualmente beneficiadas pelo crime.

O que propõe o projeto de lei

O PL 6826 foi encaminhado ao Congresso Nacional pela Presidência da República em 2010 e, em novembro de 2011, constituiu-se a Comissão Especial que passou a analisá-lo. O parecer do relator, deputado Carlos Zaratini, introduziu algumas mudanças no texto original da lei.

Pelo substitutivo, as instituições condenadas ficarão impedidas de receber recursos públicos e de fazer contratos com a administração pública pelo período de um a cinco anos e pagarão multas variando entre 0,1% e 20% do faturamento bruto anual, excluídos os impostos. Caso não seja possível utilizar esse critério, será aplicada multa com valor entre R$ 6.000 e R$ 60 milhões.

De acordo com Zaratini, o percentual das multas está adequado aos critérios usados hoje pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Já a alteração dos prazos serve para fazê-los coincidir com aqueles estabelecidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A não adequação de valores e prazos a essas entidades poderia dar margem a recursos, quando a lei fosse aplicada.

Outra alteração permite que o Estado possa fazer um “acordo de leniência” com empresas acusadas de corrupção. Por meio desse acordo, a empresa que colaborar com a apuração de algum caso poderá se livrar de algumas punições previstas no PL 6826, como a declaração de inidoneidade e a proibição de receber recursos públicos e de fechar contratos com o Estado. Mas não ficará livre da multa.

Para ocorrer o acordo, é preciso que a empresa seja a primeira a manifestar interesse em cooperar e confesse qual sua participação no ilícito.

Outros pontos de destaque do novo projeto são:
- Será punida a empresa que interferir na atuação das agências reguladoras e órgãos de investigação e fiscalização, inclusive do sistema financeiro nacional.
- Executivo, Legislativo e Judiciário ficam obrigados, em todos os níveis, a manter atualizado o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas da Controladoria-Geral da União (CGU).

O relatório do deputado Zaratini deve ser aprovado pela Comissão Especial ainda neste semestre, em caráter conclusivo. Isto quer dizer que só irá a votação na Câmara se 10% dos deputados fizerem requerimento pedindo que o projeto passe no plenário. Se não ocorrer essa ação, o PL 6826 irá diretamente ao Senado.

A pergunta é se ao ser posta em prática a Lei de Responsabilização Civil da Pessoa Jurídica vai mudar a atitude das empresas em relação a seus representantes.

Para as empresas que já atuam de forma responsável, a lei certamente servirá de incentivo para aprofundar as medidas de caráter ético entre executivos e funcionários da própria empresa e da cadeia de valor.

Para aquelas que ainda não estabeleceram nenhum mecanismo de controle de conduta, será uma excelente oportunidade para tanto. Uma das boas práticas reconhecidas pelo mercado é elaborar um código de conduta e internalizar suas regras em todos os níveis da empresa, por meio de treinamento específico, palestras periódicas, reconhecimento de boas ações etc.

Um caminho para a empresa avançar é assinar o Pacto Empresarial pela Integridade e Combate à Corrupção, que hoje já tem 273 signatárias, bem como participar do Cadastro Pró-Ética.

Para a sociedade, a Lei de Responsabilização Civil da Pessoa Jurídica significa mais um instrumento que fecha o cerco sobre a corrupção no país, ao garantir a punição da pessoa física que cometeu o ilícito. Acompanhar e monitorar a sua aplicação pode representar um avanço no controle social do Estado pela sociedade.

19/3/2012

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quarta-feira, 7 de março de 2012

O papel social das mulheres no século XXI

Por Jorge Abrahão, presidente do Instituto Ethos

Amanhã, dia 8 de março, comemora-se o Dia Internacional da Mulher. É uma data marcada pelas conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres, mas também pelos preconceitos que ainda permanecem.

As últimas décadas do século XX foram marcadas por várias transformações na sociedade, nenhuma tão marcante quanto a chamada “revolução feminina”. Dos anos 1960 em diante, as mulheres deixaram de ser apenas donas de casa para ocuparem o protagonismo social, econômico e político. Foram à escola, ganharam qualificação, disputaram o mercado de trabalho e hoje ocupam posições que há poucos anos eram consideradas “masculinas”. No entanto, o preconceito ainda se manifesta, e de maneira violenta até. São as mulheres, ao lado das crianças, as maiores vítimas da violência doméstica.

No caso brasileiro, o rápido processo de urbanização que o país conheceu nos últimos 50 anos promoveu uma grande migração do campo para a cidade. Com ela, a afluência de mulheres ao mercado de trabalho, tanto como empregadas quanto como empreendedoras que geram emprego e renda para outras mulheres.

Participação no mercado de trabalho

Como mostra a edição de 2010 da pesquisa Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 Maiores Empresas do Brasil e Suas Ações Afirmativas, ainda é grande a desigualdade entre homens e mulheres nas maiores companhias do país. No quadro funcional dessas organizações, por exemplo, as mulheres possuem uma parcela de 33,1% dos postos de trabalho. A participação declina à medida que sobe o nível hierárquico.: 26,8% na supervisão; 22,1% na gerência; e 13,7% no executivo. Note-se que, de acordo com o Censo do IBGE de 2010, as mulheres têm um número de anos de estudo superior ao dos homens e são maioria entre os brasileiros que atingiram 11 anos de estudo.

No entanto, além da sub-representação nas empresas, as mulheres ainda enfrentam desigualdade salarial em relação aos homens, quando exercem o mesmo cargo com as mesmas funções.

Isonomia salarial

Esse problema, no entanto, pode estar com os dias contados. Ontem (6/3), a Câmara dos Deputados deu um passo importante em favor da isonomia salarial entre homens e mulheres. A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (CDH) aprovou, por unanimidade e em caráter terminativo, o PL nº. 130 /11. Esse projeto de lei acrescenta um parágrafo à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para determinar que considerar o sexo, a idade, a cor ou a situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional ou oportunidades de ascensão profissional importará ao empregador multa em favor do empregado correspondente a cinco vezes a diferença verificada em todo o período da contratação. O PL será transformado em lei e será mais uma importante ferramenta jurídica para garantir a igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho.

Poder econômico
A equidade de gênero no mercado de trabalho é uma questão de justiça social. Mas não deixa de ser reflexo do “poder econômico” que elas vêm conquistando ao longo das últimas décadas.

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Data Popular, divulgada também ontem, mostra que o número de empregos formais exercido por mulheres obteve um crescimento de 75% no ano passado. Para 2012, o estudo prevê que as brasileiras devem movimentar R$ 717 bilhões.

O estudo do Data Popular ressalta ainda que, como efeito dessa evolução econômica, o otimismo das mulheres é maior do que o dos homens. Ao comparar o momento atual com o ano passado, os homens se sentem mais infelizes. Mas a maior parte das mulheres acredita que o Brasil e o mundo vão melhorar em 2012, bem como a sua própria vida financeira, profissional e... amorosa.

Empreendedorismo

Talvez seja esse otimismo o impulsionador de outro comportamento da mulher brasileira, percebido por pesquisa: o empreendedorismo. Segundo levantamento realizado em diversos países pela consultoria Global Entrepreneurship Monitor (GEM), a mulher brasileira é hoje uma das que mais empreendem no mundo. Em 2011, entre os empreendedores iniciais, 50,7% eram homens e 49,3% mulheres, mantendo o equilíbrio entre gêneros no empreendedorismo nacional.

Somente em Gana o número de mulheres empreendedoras é maior do que o de homens. O Brasil ocupa a segunda posição, com 21,1 milhões de empreendedores, dos quais 10,7 milhões pertencem ao sexo masculino e 10,4 milhões ao feminino.

Quanto aos setores de atuação, as mulheres preferem, em 33% dos casos, atividades ligadas ao comércio varejista, com 20% no ramo da alimentação; 16% atuam em serviços domésticos(como empregadas ou como empreendedoras) e 12% na indústria de transformação.

Outras características do empreendedorismo feminino apontadas pelo estudo é que as mulheres têm melhor conhecimento do mercado, são mais preparadas, planejam melhor e sabem integrar melhor as atividades pessoais e profissionais, o que contribui para o maior sucesso dos empreendimentos liderados por mulheres.

Esse dia 8 de março pode, muito bem, representar a síntese da revolução feminina dos últimos 100 anos. Um movimento às vezes ruidoso, às vezes silencioso, que reposicionou a mulher na família, no trabalho e na sociedade. Com isso, família, trabalho e sociedade também mudaram e puseram na ordem do dia muitas perguntas que ainda não encontraram resposta:
- Como essa mulher se vê no atual momento político e econômico do país?
- Adiar o momento da maternidade para investir na carreira é uma boa opção?
- Com a vida profissional cada dia mais movimentada, dá tempo de cuidar da família e da saúde?
- Como essas novas empreendedoras se vêem e quais são suas perspectivas?

Que esse 8 de março impulsione essas discussões e coloque em foco projetos e programas que incentivem a promoção de uma sociedade cada vez mais igualitária e sustentável.

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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

“Rio+20, as empresas e o governo brasileiro”

No dia 1º. de novembro, o governo brasileiro enviou à Organização das Nações Unidas (ONU) as propostas que elaborou para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. O país será sede do evento em junho de 2012 e, no documento entregue, firmou posição de defesa da inclusão social e de combate à pobreza como fundamentais para o mundo construir um novo modelo de desenvolvimento, mais sustentável e justo.

O Instituto Ethos participou da Comissão Nacional que elaborou o posicionamento oficial do Brasil e também construiu um posicionamento próprio, discutido com mais de 90 instituições, entre empresas e organizações da sociedade civil.

O objetivo do documento do governo é influenciar nas negociações da Conferência da ONU, bem como construir um compromisso político substancial, que aumente a capacidade de efetivação dos acordos multilaterais já firmados em outras conferências da ONU. Assim sendo, oferece algumas sugestões e propõe a adoção de metas e ações concretas que vão contribuir tanto para superar a crise atual quanto para criar um novo paradigma de desenvolvimento.

Entre as propostas do documento do governo brasileiro e o posicionamento das empresas e ONGs reunidas pelo Ethos, existem importantes convergências e substanciais diferenças. Há, no segundo, um detalhamento maior de propostas para levar à emergência de uma economia includente, verde e responsável, aspecto pouco enfatizado no documento oficial.

Conheça a seguir um pouco mais de ambos os documentos.

As propostas do governo brasileiro

O documento do governo brasileiro, já enviado à ONU, assenta suas propostas em duas premissas básicas:
1. O desenvolvimento sustentável exige erradicação da pobreza e inclusão social;
2. A governança mundial precisa voltar-se para resolver o problema da miséria, respeitando os limites do planeta.

Com isso, o Brasil quer influenciar para que as discussões na Rio+20 sejam sobre o modelo de desenvolvimento que o mundo precisa para melhorar as condições de vida das pessoas, porque é isso que vai ajudar a preservar o planeta. E o país enumera algumas propostas para o planeta atingir o objetivo do desenvolvimento sustentável. Entre as sugestões brasileiras estão:
• a criação de uma “bolsa verde global” pela qual os países garantiriam àquelas pessoas abaixo da linha da pobreza uma renda mínima, segurança alimentar, moradia digna e acesso à água;
• o uso das compras públicas e do crédito bancário para promover práticas amigáveis ao meio ambiente, entre as empresas; e
• uma maior abertura, por parte dos órgãos mundiais multilaterais, ao setor privado, que engloba não só empresas, mas também movimentos sociais e entidades sem fins lucrativos. O governo brasileiro acredita que limitar as discussões aos representantes oficiais (governos) não considera a importância da atuação de agentes estratégicos que, muitas vezes, já são responsáveis pela adoção de certas decisões e práticas dentro dos países.

O Brasil também está pleiteando, junto à ONU, a realização de uma mesa-redonda com o setor privado, em data marcada entre a última reunião preparatória (30 de maio) e o primeiro dia da conferência (4 de junho). O objetivo seria fazer com que a proposta de declaração da Rio+20 passe pelos representantes do setor privado presentes à conferência antes de chegar aos líderes dos países.

A ênfase do governo brasileiro na ampliação da influência do setor privado se explica pelo fato de que os resultados da Rio+20 não são vinculantes, isto é, nenhum país está obrigado a segui-los. Mesmo assim, é possível haver conseqüências práticas. Por isso, o Brasil está focando a ação, e não a legislação. As diretrizes aprovadas na conferência poderão ser usadas para pressionar fóruns internacionais formais a adotar medidas na direção do desenvolvimento sustentável, por exemplo.

Nesse sentido, o posicionamento adotado por empresas e entidades articuladas pelo Ethos tem pontos de contato com o documento oficial brasileiro e reforça o foco na ação, sugerindo algumas medidas extremamente práticas para a construção de um novo modelo de desenvolvimento.

A proposta encabeçada pelo Ethos

Esse documento ressalta as expressivas diferenças de contexto entre a Rio+20 e as três grandes conferências de meio ambiente, realizadas em 1972 (Estocolmo), em 1992 (Rio) e em 2002 (em Johanesburgo). Estocolmo antecedeu as duas grandes crises do petróleo que foram o gatilho para iniciar a desregulação da economia. A Rio-92 ocorreu no meio do neoliberalismo, cujas premissas não contribuem para o desenvolvimento sustentável. Johanesburgo 2002 realizou-se quando a financeirização estava em seu auge. Já a Rio + 20 tem como cenário a crise financeira mundial iniciada em 2008, com novos desdobramentos em 2010-2011. Há o esgotamento do modelo de globalização econômica tal qual foi conhecido até agora, tornando necessário e urgente outro rumo para a economia e a política, baseado nos princípios e imperativos do desenvolvimento sustentável.

Assim pensando, o grupo de empresas e entidades que assinam o documento entende que as principais tarefas da Rio+20 são:
• fazer uma articulação entre a conferência e a busca de soluções para a crise;
• estabelecer uma agenda de transição para uma economia verde, includente e responsável;
• estimular uma atuação dos governos no sentido de formular planos nacionais de desenvolvimento sustentável; e
• construir um novo marco institucional no âmbito da ONU.

Para tanto, propõe internalizar algumas diretrizes nas economias nacionais, bem como na política nacional e internacional. No âmbito das economias nacionais, são sugeridas medidas como:
• um novo padrão nacional de contabilidade e mensuração do desenvolvimento, redefinindo o conceito de prosperidade nacional para além do PIB, medindo capitais naturais, sociais, humanos e financeiros;
• precificação do carbono e criação de mercado interno de carbono, com adoção de um padrão local para precificá-lo;
• pagamento por serviços de ecossistemas ; e
• estabelecimento de padrões mínimos de operação, em termos de trabalho decente, práticas socioambientais sustentáveis e ciclo de produção fechado. Tais padrões devem ser válidos para empresas públicas nacionais, concessionárias e multinacionais, bem como para companhias nacionais que operem internacionalmente.

No âmbito do novo marco institucional, o posicionamento das empresas e entidades signatárias reafirma o papel fundamental das Nações Unidas no estímulo e apoio aos planos nacionais, com medidas como:
• a instituição de um fundo internacional para ajudar a execução dos planos nacionais;
• a adoção, pela ONU, de um novo padrão de contabilidade para medir o desenvolvimento e monitorar os planos nacionais;
• a precificação do carbono e a criação do mercado global de carbono;
• pagamento pelos serviços dos ecossistemas;
• estabelecimento de padrões globais mínimos de operação; e
• redefinição da geografia de cooperação técnica e científica.

Para dar conta dessas tarefas em nível institucional, o documento sugere a articulação de uma “instância guarda-chuva”, no âmbito da ONU, que receberia os planos nacionais de desenvolvimento sustentável baseados em uma agenda mínima de metas como:
• diminuição da pegada ecológica;
• erradicação da miséria;
• redução das desigualdades;
• acesso a renda, bens e serviços públicos; e
• instituição de sistema de integridade e transparência nas relações público-privadas.

Essa instância guarda-chuva teria a finalidade de planejar, coordenar, estimular e implementar os compromissos voltados para o desenvolvimento sustentável, com nível hierárquico semelhante ao do Conselho de Segurança.

Os planos nacionais, na proposta encabeçada pelo Ethos, serão financiados por um fundo internacional, com recursos constituídos, entre outros meios, pela taxação de 0,05% sobre movimentações financeiras internacionais de caráter especulativo.

Se não é sensato esperar que a Rio+20 resolva todos os impasses da humanidade, é lícito e plausível trabalhar para que essa conferência gere entendimentos políticos que levem a passos importantes no rumo do desenvolvimento sustentável. É nessa perspectiva que as empresas e o Instituto Ethos apresentaram seu posicionamento à ONU e à sociedade.

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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Senado aprova Lei de Acesso à Informação com fim do sigilo eterno

Essa aprovação representa uma grande vitória da sociedade civil brasileira que vem se mobilizando constantemente em prol de mais transparência nas relações público-privadas. Com a sanção da presidenta Dilma Rousseff, a nova lei entrará em vigor em 180 dias.

O ponto mais polêmico – o tempo de sigilo dos documentos ultrassecretos e secretos – foi aprovado conforme o desejo da sociedade civil – sigilo máximo de 50 anos. Assim, é possível dizer que, por lei, o cidadão terá direito a consultar qualquer informação que julgar importante, sem ter de explicar por que ou para quê. No entanto, o aspecto mais importante dessa legislação é que ela é ferramenta fundamental para a ampliação do controle social sobre a coisa pública, pois diz respeito aos três poderes e aos três níveis da Federação.

O Brasil passa, assim, a integrar o grupo de 89 países que possuem uma lei de acesso a informações públicas. A sociedade precisa, agora, fazê-la funcionar.

Contexto


Depois de dois anos de tramitação no Congresso Nacional, o projeto de lei de acesso à informação foi aprovado no plenário do Senado na tarde de terça-feira, dia 24 de outubro. O que representa esta aprovação?

Ela significa a consolidação da Constituição de 1988, chamada “Constituição Cidadã”, por garantir a ampliação do controle da sociedade sobre os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) nos três níveis federativos (federal, estadual e municipal).

Assim, se você, caro ouvinte, quiser saber quanto a escola do seu bairro gasta com merenda escolar ou quais decretos embasaram a privatização das empresas estatais brasileiras, você terá direito a acessar estas informações. Pelo texto aprovado, o pedido de dados, sigilosos ou não, poderá ser feito por email e o agente público está proibido de constranger o cidadão interessado nessas informações.

O que diz a lei

O texto da Lei de Acesso a Informações Públicas traz algumas inovações importantes que fortalecem a cidadania, tais como:

- transparência é a regra: como diz o texto da lei, o governo (nas três esferas da federação) deverá ter como regra a publicidade de seus atos e como exceção o sigilo. Será obrigação da administração pública divulgar informações de interesse da sociedade, independente de solicitação.

A lei também obriga aos governos manter as informações atualizadas em sites de fácil acesso, com ferramentas amigáveis de pesquisa e possibilidade de gravação de relatórios em diversos formatos.

- fim do sigilo eterno:
O tempo máximo para uma informação ser mantida em reserva será de 50 anos (25 mais 25). Esse prazo vale apenas para os documentos ultrassecretos, os únicos que podem ter o prazo prorrogado por uma única vez. Documentos secretos têm sigilo de 15 anos não prorrogáveis; e documentos reservados, de 5 anos, também não renováveis.

- lista de dados sigilosos: todos os órgãos públicos dos três poderes em todos os âmbitos federativos precisarão publicar anualmente uma lista de documentos e dados cujos prazos de sigilo encerraram-se, indicando qual era o grau de sigilo de cada um. Hoje inexiste tal obrigação.

- classificação do sigilo – no âmbito da administração pública federal, apenas presidente, vice-presidente, ministros, comandantes militares e chefes de missões diplomáticas podem classificar documentos como “ultrassecretos”. No âmbito estadual e municipal, leis específicas devem definir quem classifica.

Em busca de respostas


A nova legislação traz, todavia, algumas questões que precisam de resposta, tais como:

- prazos de sigilo: começam a contar a partir de quando, da sanção presidencial? Da data em que foram classificados? A lei estipula um prazo de dois anos para a reavaliação de dados secretos e ultrassecretos. Se os prazos de sigilo estiverem por vencer, os documentos ultrassecretos poderão ser reclassificados dessa forma e ficar mais 50 anos sem consulta?

- orçamento: de onde sairão os recursos e os funcionários para o cumprimento da lei? Esses itens não foram previstos no orçamento da União de 2012, nem tampouco dos estados e municípios.

- Estados e Municípios: a lei é vaga quanto a prazos ou mesmo à necessidade de estados e municípios aprovarem legislação própria para acesso às informações locais. Até a possível aprovação, vale a lei federal nessas instâncias?

Governo aberto

A Lei de Acesso à Informação é parte de um plano de ações com o qual o governo brasileiro comprometeu-se em setembro último, durante a Assembléia Geral da ONU, para ampliar a transparência das políticas públicas e o acesso da cidadania às informações de governos.

Na verdade, o Brasil aderiu à “Parceria Governo Aberto” , um pacto ao qual os países aderem e, ao fazer isso, comprometem-se em divulgar no site específico da iniciativa os planos de ação dos respectivos governos em favor da transparência e da prestação de contas à cidadania.

A iniciativa dos governos do Brasil e dos EUA foi apresentada um dia antes da Assembléia da ONU, numa cerimônia a que compareceram Dilma Rousseff, Barack Obama e 60 chefes de Estado e governantes.

Para participar da PGA, cada país precisa assumir compromissos em pelo menos uma de quatro áreas-chave: transparência fiscal; divulgações financeiras por autoridades eleitas ou da alta administração; participação cidadã; e acesso a informação. Os compromissos também precisam atender pelo menos um dos cinco desafios colocados pela parceria:

Fortalecimento dos Serviços Públicos; Aumento da Integridade Pública; Gestão Mais Eficaz dos Recursos Públicos; Criação de Comunidades Mais Seguras; e Aumento da Responsabilidade Empresarial.

O Brasil, que copreside a iniciativa do Governo Aberto, tem planos para todos os aspectos das estratégias. Na época em que apresentou esse plano, em setembro, o país tinha um projeto já instalado e um único ponto fraco. O projeto é o Cadastro Pró-Ética, realizado em parceria pelo Instituto Ethos e pela Controladoria-Geral da União (CGU) para dar visibilidade às empresas que investem em medidas em favor da ética, da integridade e da prevenção da corrupção.

O ponto fraco era a falta de uma lei que garantisse o acesso dos cidadãos às informações públicas. Agora, não é mais.

O país possui, no entanto, outros desafios. O maior deles é tornar o Estado brasileiro aberto aos seus cidadãos, e não apenas uma parte dele, representada pelo poder executivo federal.

O desafio, então, é integrar as ações. No Legislativo federal, há mais de 60 projetos de lei com a tramitação parada por falta de relatoria, por emendas propostas, por urgência em outras pautas, enfim, por motivos variados. No Judiciário, há uma ação sendo julgada pelo STF, esvaziando a capacidade do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de “julgar” os juízes. Com isso, esvazia-se o controle social sobre esse poder.

Esses fatos servem para alertar a sociedade de que uma grande vitória não indica o fim da luta. Pelo contrário, põe nos ombros de todos os cidadãos mais responsabilidade e mais objetivos a serem alcançados.

Em relação ao acesso à informação, o próximo passo é fazer com a lei seja instituída e aplicada em todas as instâncias de governo. E que os agentes público sejam capacitados a atender as novas demandas da sociedade, compreendendo que eles são os “guardiães” e não os “donos” dos dados do Estado.

Mas, no fim, o que é a democracia senão um aperfeiçoamento constante dos direitos e liberdades de todos?

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quinta-feira, 20 de outubro de 2011

EIMA 8: Cidades conscientes de seus resíduos

No eixo-temático Cidades do segundo dia do EIMA 8, o debate concentrou-se nas políticas para gestão de resíduos sólidos. Experiências de diversos países ibero-americanos enriqueceram propostas e soluções.

Ao dar início às apresentações, Javier Maroto, prefeito de Victoria-Gasteiz, nomeada Cidade Verde Europeia 2012, demonstrou estratégias e políticas aplicadas ao tema em uma população local de cerca de 250 mil habitantes. Para Maroto, “o grande desafio é fazer com que cada habitante se preocupe com a destinação dos resíduos de seu próprio consumo”.

O diretor da Agência de Resíduos da Catalunha, Josep Maria Tost, dividiu com a plateia as políticas que também fizeram da gestão catalã um modelo de sustentabilidade. “Foram vinte anos trabalhando o tema, a partir de diretrizes e leis nacionais e da União Europeia. Não foi feito de um dia para o outro.” Segundo Tost, para sanar o problema das sacolas plásticas, “foram três anos de trabalho e muitos acordos para chegarmos em consensos. Negociamos com os fabricantes de sacolas plásticas, criamos mecanismos de controle que incluíram inspeções e multas”. O diretor acrescentou também que os valores arrecadados pelo “imposto verde” são revertidos para os programas de reciclagem dos municípios.

Assim, Tost sugeriu, “no Brasil não se deve ter pressa, mas aprender conjuntamente. Reciclar é uma das obrigações dos cidadãos do Século 21. Na Espanha, nossa motivação vem principalmente da geração de empregos e economia de matérias-primas”.

Acerca da Política Nacional de Resíduos Sólidos do Brasil (PNRS), Pedro Stech, diretor de Tecnologia Ambiental da empresa Estre, alertou sobre a importância da gestão integrada entre municípios. “A PNRS deu enfoque a um tema que antes ficava em segundo plano, entre pessoas sem conhecimento pleno do trabalho. Os resultados melhoraram, a gestão tornou-se um ponto importante e a iniciativa privada passou a ver grandes oportunidades.”

No Brasil, segundo Stech, “ainda vivemos a realidade dos lixões. O destino de muitos deles é desconhecido e o gerenciamento, inadequado”. Para ele, “existem dois marcos na Política Nacional: o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, que uniu a coleta seletiva, cooperativas e consórcios, oferecendo soluções conjuntas regionais, em regiões metropolitanas. Depois, vem o fato de que em 2014 os lixões serão proibidos no país. Isto gerará um novo ciclo de negócios na área”, acredita. Para Stech, “aterros controlados são formas de esconder o problema, sou contra. O mínimo que podemos aceitar são os aterros sanitários”, defendeu.

Da Ambilamp, organização dos produtores de lâmpadas, registrada pelo Ministério de Indústria, Comércio e Turismo da Espanha, falou o diretor-geral, Juan Carlos Enrique. “Hoje contamos com 148 empresas. A legislação intensificou-se entre 2002 e 2008, acerca da destinação de aparelhos elétricos e eletrônicos. Na Federação Europeia de Produtores de Lâmpadas há um rico intercâmbio de experiências. Na Espanha, montamos um sistema de tratamento específico para a reciclagem de mercúrio e compostos do pó fluorescente”, explicou Enrique. A Ambilamp pretende duplicar a quantidade de lâmpadas que serão recolhidas, entre 2011 e 2014.

Para Maria Cecília Loschiavo, titular da Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo, é fundamental uma revisão do conceito de design: “uma compreensão leiga privilegiou aspectos estéticos nas práticas industriais. A PNRS nos traz vitalidade para trabalharmos a ‘desbanalização’ do termo”. Ela defendeu que “viemos de uma história de escassez para a de abundância. No Século 21, o excesso de consumo torna necessário repensarmos nossos parâmetros e estilo de vida”. Citando Guimarães Rosa, Loschiavo convocou os participantes para “uma conversa desarmada” em torno do bem comum: “o design deve servir à sustentabilidade, precisamos pensar cidades criativas, pontos de coleta com sistemas informatizados, oferecer educação e estímulo aos cidadãos por meio de cartilhas, guias e experiências. Todavia, estas por mais que sirvam enquanto referências, nem sempre poderão ser reaplicáveis”, ponderou.

Representando o Ministério do Meio Ambiente, o secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, Nabil Bonduki, ofereceu um panorama das iniciativas correntes para viabilização da PNRS, como uma “responsabilidade compartilhada”.

“Os municípios deverão entrosar planos estaduais e federais, ou então serão punidos. É essencial o apoio dos Estados para a regionalização das políticas intermunicipais. Economicamente, municípios com menos de 150 mil habitantes tornam-se inviáveis. Todos os Estados participam, por meio de 380 agrupamentos. Esta é a forma encontrada para levar a Política adiante”, explicou Bonduki.

No Chile, a política para resíduos sólidos também passa por aperfeiçoamento. Segundo a avaliação de Mayling Yuen, diretora de Metodologia da Fundação Casa da Paz, “é um trabalho de formigas, vamos de lugar em lugar. O processo se aprimorou a partir de 2008, com o plano de ação da Comissão Nacional do Meio Ambiente. Em 2009, criou-se o Santiago Recicla, estratégia de linha nacional”.

“Focamos no trabalho do reciclador, e tivemos que oferecer medidas como privatização da reciclagem para fomentar condições e poder avançar em processos de separação mecânica dos materiais e capacitação daqueles que coletam para reciclagem”, explicou Yuen.

Por fim, Helio Mattar, diretor do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente, chamou atenção para o papel do consumidor, “que é o final e o início da questão” nos mecanismos de ação para a sustentabilidade dos resíduos sólidos. Segundo Mattar, “a solução só virá da conscientização dos consumidores, futuros multiplicadores de novos hábitos”. Mencionando a experiência do Akatu, Mattar compartilhou a dificuldade de provocar uma reação positiva nos consumidores. “Para retirar o consumidor da zona de conforto não existe mágica, é preciso mostrar o problema e o repertório de ações que existem. É importante dimensionar para o indivíduo o peso que ele tem na conta final do município. Podemos educar o consumidor por metodologias e dinâmicas, dar motivação para que ele possa agir, além de formar grupos de referência para o consumo consciente que tenham melhores parâmetros”, observou Mattar.

Por Marília Arantes, da Envolverde

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segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Transparência em vez de explicações

Mais uma denúncia de corrupção envolvendo ministro vira assunto de domingo nas padarias paulistanas. A bola da vez é o ministro dos Esportes.

O ministro está disposto a ir ao Congresso dar todas as explicações necessárias e pediu à Polícia Federal investigar o caso.

Sem entrar no mérito das denúncias, fato é que o ministro e o governo mais uma vez ficam na defensiva, e, diante de um suposto caso de corrupção, correm atrás do prejuízo, tendo de esclarecer informações que já poderiam estar à disposição da sociedade. Este fato mostra o que vem pela frente. O jogo ainda nem bem começou e o ministro já está sento bombardeado. Imagine o que virá com os grandes investimentos da Copa e a forma apressada com que terão de ser feitos. Nas conversas de rua, a idéia que corre solta é de que há muita gente interessada nos atrasos, porque assim poderão ganhar mais dinheiro.

Aqui vale, mais do nunca, o velho ditado: melhor prevenir do que remediar. E contra a corrupção, o melhor remédio é a transparência.

Afinal, o que sabemos sobre as obras da Copa do Mundo?

1 – Em relação aos custos, o governo federal divulgou na sexta-feira, dia 14, a atualização da matriz de responsabilidades, contabilizando 26,1 bilhões de reais. Por decreto do próprio governo federal, os ministérios que possuem obras relativas à Copa do Mundo precisam discriminar no orçamento da pasta, em alínea própria, os recursos que estão sendo gastos com essas obras.

A mesma orientação deveria ser seguida pelos Estados e Municípios. Aliás, o governo federal só deveria aceitar que a obra entrasse na matriz se os estados e municípios listassem os recursos em seus próprios orçamentos.

2 – Ainda não sabemos quanto vai custar a Copa do Mundo. A matriz de responsabilidade traz obras que não foram iniciadas e, por outro lado, há obras iniciadas que não estão na matriz. Para quem não sabe, a Matriz de Responsabilidades da Copa de 2014 é um documento que traz os compromissos firmados pelos governos federal, estaduais e municipais, e também por clubes de futebol, destaca os papéis assumidos por cada envolvido na liberação de recursos e na execução de cada uma das ações. A matriz estabelece ainda os projetos que serão feitos, com cronograma para entrega, previsão de gastos e indicação da origem de financiamento.

É preciso atualizar as informações e os diversos órgãos de governo envolvidos com a Copa estão trabalhando nisso. O TCU determinou que as obras não licitadas até o final de 2011 sairão da matriz. Assim, com as informações atualizadas a respeito de obras verdadeiramente licitadas e em andamento, poderemos ter uma idéia mais detalhada de custos só em 2012. Então, hoje, a matriz de responsabilidades está desatualizada.

3 – Outra discussão que não está muito bem esclarecida para a sociedade é o legado que estas obras vão deixar para a população. Há uma determinação federal de que os gestores públicos ponham nos projetos e nos planejamentos o legado de cada obra.

4 – Os Estados e Municípios que vão receber obras da Copa também precisariam manter portais com todas as informações atualizadas sobre os empreendimentos. Embora os portais estejam no ar, não há um padrão de informações mínimas para a população, o que também poderia ser uma exigência do governo federal. É importante que o cidadão ou cidadã tenha acesso aos contratos, aos gastos feitos, andamento das obras, impacto e legado das obras, custo atualizado e orientações de como contribuir com a fiscalização.

Outra providência é que os Estados criem a Câmara de Transparência com a participação das organizações da sociedade civil. Na Câmara de Transparência federal, a sociedade civil está representada pela OAB, Amarribo, Ethos, Confea, Inesc e Abraji.

Para ampliar ainda mais a transparência, que sejam realizadas audiências públicas para discutir com a população os investimentos feitos e ouvir sugestões.

Risco para a Copa?


O risco para a Copa não está nos possíveis atrasos. Está na falta de transparência e na falta de rapidez para atualizar as informações. Por isso, é fundamental que todos esses mecanismos de transparência estejam funcionando adequadamente o mais rápido possível.

A transparência permite que a população ajude os governos a controlar os gastos e evitar a corrupção. E, com controle social de fato, todos os agentes vão manter as informações em dia sobre custos, responsabilidades e andamento das obras.

A transparência também ajuda a separar o joio do trigo. As empresas sérias e responsáveis não querem atrasar obras nem fazer aditivos a licitações. Querem entregar o empreendimento dentro do prazo e com qualidade. Elas sabem que um dos legados mais importantes da Copa também poderá ser o da obra bem feita, dentro do projeto estabelecido.

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sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A moratória da soja e o desmatamento da Amazônia

Ontem foi anunciada, pelo Ministério do Meio Ambiente, a prorrogação da moratória da soja até 2013. Isto significa que o acordo feito em 2006 entre exportadores do grão, governo e ONGs , de não comprar soja de novas áreas desmatadas na Amazônia, previsto para durar um ano, foi novamente estendido, desta vez até 2013.

A prorrogação foi justificada pelo Ministério pelo aumento da área desmatada para cultivo da soja. Então, a moratória está atingindo seu objetivo?

O que é a moratória da soja

Moratória da soja é o nome que recebeu o pacto ambiental havido entre as entidades representativas dos produtores de soja no Brasil , ongs ambientais e, mais tarde, do próprio governo, prevendo a adoção de medidas contra o desmatamento na Amazônia . Inicialmente teve o prazo de duração de dois anos a contar de 24 de julho de 2006.

O pacto firmado entre essas entidades e que prevalece até hoje é voluntário e determina que as empresas comercializadoras / exportadoras de soja não comprarão o grão originário de áreas de desmatamento na Amazônia.

Em 2008, o Ministério do Meio Ambiente subscreveu a moratória. Nesse mesmo ano, ela foi estendida até 2009, depois até 2010, 2011 e, agora, até 2013.

A verdade é que o desmatamento na Amazônia vem aumentando, e ele ocorre justamente para o plantio da soja. Para alguns especialistas, a constatação desse aumento decorre muito mais de um sistema de monitoramento mais aperfeiçoado, via satélite, que consegue “enxergar” zonas de desmate em propriedades menores, até 100 hectares. Por isso, a moratória vem sendo renovada e ampliada, com mais propriedades fazendo parte da relação daquelas das quais os comerciantes não compram o grão.

A moratória é gerida pelo Grupo de Trabalho da Soja (GTS), por exportadores, governo e ONGs. Compõem o grupo empresas associadas à Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e à Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), Ministério do Meio Ambiente, Banco do Brasil e ONGs como a Conservação Internacional, Greenpeace, IPAM, TNC e WWF-Brasil.

Desmatamento aumentou

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) tem divulgado dados que indicam o aumento do desmatamento para a soja na Amazônia em 86%, este ano, em relação a 2010. Números publicados na Folha de hoje dão conta de que a área desmatada com soja subiu de 6.295 hectares em 2009/2010 para 11.698 hectares em 2010 /2011.

Para o Ministério do Meio Ambiente, a discussão na Câmara sobre a reforma do Código Florestal levou a um pico de devastação no primeiro semestre, porque os debates teriam criado no setor produtivo a expectativa de anistia aos desmatamentos ilegais.

Para diminuir a fonte de pressão sobre o Código Florestal é que o GTS optou por prolongar a moratória.

Código Florestal e cadastro fundiário


De fato, no momento em que o Senado discute a nova lei florestal, é importante que os senadores saibam que um grupo expressivo do agronegócio não quer mais desmatamento. A moratória tem, então, esse efeito sinalizador.

O GTS também está preparando um programa de incentivo ao Cadastro Ambiental Rural (CAR) na Amazônia para orientar e sensibilizar o produtor rural sobre a necessidade e de adequação à legislação. Por meio do CAR, as fazendas tornam-se visíveis ao satélite e, portanto, ao monitoramento. Para obter o CAR, o produtor precisa atestar, entre outros fatos, de quem comprou a terra, mostrando registros de cartórios e esses documentos nem sempre estão disponíveis. Por isso, o cadastro não avança com a velocidade necessária e desejada para garantir uma soja livre de desmate.

Para onde caminha a moratória?

Num cenário de crise internacional e de possível queda nos preços das commodities, a moratória poderá ter sucesso? Algum exportador vai deixar de ganhar dinheiro em favor da preservação da Amazônia?

Essas perguntas estão sendo feitas por muita gente. E elas realmente mostram o dilema da moratória da soja.

Existe pressão aqui dentro e lá fora pelo fim do desmate na Amazônia. Isso faz com que compradores europeus, por exemplo fazerem questão do CAR para adquirir a soja brasileira. Os chineses, no entanto, não fazem exigências ambientais.

Internamente, a sociedade pressionou a Câmara pela não aprovação do novo Código Florestal e, agora, volta-se ao Senado para que essa casa não retroceda nas leis que protegem nosso patrimônio natural.

Nesse cenário, os participantes do GTS vêm resistindo bravamente, renovando a moratória e trabalhando para que os produtores regularizem suas propriedades, trabalhem dentro da lei e tornem-se os elos da preservação do bioma amazônico.

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segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A Lei Geral da Copa e os interesses dos brasileiros

Junto com a polêmica sobre os gastos com as obras, outro tema vem ganhando vulto nos noticiários sobre a Copa 2014. Trata-se da chamada Lei Geral da Copa, que regula preços dos ingressos, marcas dos patrocinadores e outras medidas exigidas pela FIFA para a realização desse evento no Brasil.

O texto foi encaminhado ao Congresso Nacional pelo Executivo em 14 de setembro e já está sendo apreciado por uma comissão especial da Câmara.

Não agradou a FIFA e nem à sociedade civil brasileira organizada em torno da defesa dos interesses nacionais nesse evento. Os pontos de discórdia não são "picuinhas", eles dizem respeito a direitos duramente conquistados por todos os cidadãos brasileiros. Vamos entender um pouco sobre o assunto.

Contexto


Desde que os tempos da Taça Jules Rimet, existe um acordo entre o país-sede da Copa do Mundo e a entidade máxima desse esporte, a FIFA. Até o campeonato no Chile, em 1962, esses acordos eram mais simples. Limitavam-se a compromissos de segurança, hospedagem adequada para as delegações, bem como estádios que comportassem um bom público. Os países construíam, no máximo, um estádio maior, que serviria para a final da Copa. O Maracanã, por exemplo, foi feito especialmente para a Copa de 50. Em Belo Horizonte, um das sedes na época, os jogos foram disputados no antigo estádio do Atlético Mineiro, que apenas recebeu pintura nova.

Em 1966, na Inglaterra, com o início das transmissões ao vivo, via satélite, as negociações entre a FIFA e o país-sede tornaram-se mais complexas, envolvendo direitos de transmissão e de imagem. De 1970 até 1998, a FIFA entrou firme no marketing e, a título de defender a “marca” Copa do Mundo, passou a exigir compromissos dos países-sede que, muitas vezes, feriam a legislação local. Nos anos 1990, o futebol tornou-se o esporte midiático por excelência, cujas transmissões por TV atingiam qualquer canto do planeta. A Copa, o momento máximo desse espetáculo, virou uma empreitada, sob rígido controle da FIFA que, a partir de 2002, passa a definir as dimensões e características dos estádios, o preço dos ingressos, a cerveja vendida durante os jogos e até o tipo de repressão desejável contra a venda de produtos piratas.

Em resumo, o investimento é feito para atender prioritariamente as necessidades financeiras da FIFA. Os interesses dos países e do próprio futebol estão em segundo plano.

Como na maioria dos países-sede existe democracia, essas exigências precisam passar pela votação no Congresso. Assim, elas são reunidas num corpo jurídico que no Brasil recebeu o nome de Lei Geral da Copa.

Dois exemplos

Nos países onde a sociedade se mobilizou, esse regulamento (vamos chamar assim) ficou mais parecido com o interesse do país. Ao contrário, quando a sociedade não se impôs com suas demandas, a Lei Geral da Copa passou por cima até mesmo das constituições nacionais.

Na Alemanha, em 2006, o Congresso não permitiu que a FIFA monopolizasse a venda de cerveja nos estádios. Alegando que essa bebida é um patrimônio alemão, com características arraigadas em cada região do país, o governo alemão não aceitou a exigência de só vender nos estádios (e no entorno), nos dias de jogo a marca patrocinadora da FIFA. Com relação a obras nos estádios, as autoridades alemãs exigiram que a final fosse realizada no Estádio de Berlim, que tem parte de sua estrutura interna tombada como patrimônio histórico. De todas as mudanças exigidas, a única possível era cobrir o estádio, mesmo assim, fora dos padrões da FIFA, pois algumas vigas cobriam a visão dos assentos próximos a elas. Mas, valeu a vontade das autoridades alemãs. A final da Copa de 2006 foi jogada no estádio de Berlim.

Na África do Sul, as autoridades aceitaram até restringir as liberdades individuais de seus cidadãos durante a Copa – o que fere a atual constituição do país. Quem fosse pego com produtos piratas poderia ficar preso sem processo até o final da competição.

E o Brasil?

O texto da Lei Geral da Copa já está no Congresso e deve ser aprovada só no ano que vem. O Governo Federal e a Fifa esperavam que a legislação entrasse em vigor até o fim do ano. Mas ela traz muitos temas polêmicos que precisam mesmo ser discutidos não só no Congresso, mas na sociedade. Até que ponto o Brasil deve aceitar as normas da Fifa para organizar o evento? A resposta a essa pergunta vai implicar numa lei mais ou menos voltada aos interesses da cidadania.

O primeiro tema polêmico diz respeito ao preço dos ingressos. O projeto de lei garante à Fifa a determinação do preço dos ingressos. Mas, a partir daí, valem as leis brasileiras que determinam meia entrada para idosos e estudantes, uma diferença de 100 milhões de dólares na arrecadação que a Fifa não quer arcar. Por isso, está exigindo que se especifique na lei a não-vigência da meia entrada durante a Copa. Para isso, seria preciso alterar o Estatuto do Idoso.

Para estudantes, Estados e municípios é que têm o poder de decidir.

A Fifa quer limitar os chamados “ingressos populares” a uma porcentagem sobre o total de ingressos que espera vender. O Brasil quer que essa porcentagem seja em função da capacidade de público dos estádios. Argumenta que nas últimas três Copas, a Fifa precisou distribuir ingressos gratuitamente, pois não conseguiu vendê-los a turistas.

Outro ponto polêmico é a “venda casada” (hospedagem, transporte aéreo e ingressos para as partidas), vedada pelo Código de Defesa do Consumidor.

Também está em discussão a venda de bebidas alcoólicas nos estádios. Pelo Estatuto do Torcedor de 2003, ela não é permitida. A Fifa não só quer quebrar essa norma, como quer impor apenas a venda da marca, patrocinadora da entidade.

Os debates já começaram no plenário e na sociedade. É preciso lembrar que, são os cidadãos brasileiros que estão pagando essa festa e dela têm o direito de participar.

É aceitável a ingerência de um ente privado internacional em assuntos domésticos que dizem respeito à maneira como uma sociedade escolhe enfrentar seus problemas?

O Brasil vem obtendo crescente influência no cenário internacional, justamente por estar enfrentando de maneira inovadora e positiva a “visão de mundo” que privilegia os negócios em detrimento dos direitos sociais e da soberania dos países. A Copa é um momento emblemático para demonstrar que a Fifa não pode interferir na vida institucional de um país, seja ele qual for.

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sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Sustentabilidade tem valor no mercado

A mais recente pesquisa mundial da da McKinsey mostra que a sustentabilidade está se consolidando na agenda empresarial mundial.

Chamada “Tirando valor da sustentabilidade”, a pesquisa foi lançada na semana passada em São Paulo. Realizada durante o mês de julho, online, coletou as respostas de 3 mil executivos ocupando diferentes cargos em diferentes ramos da economia. O objetivo era saber como estava a situação da gestão sustentável “da porta para dentro” da empresa.

Os resultados mostraram alguns avanços importantes.

Sem maquiagem

O primeiro resultado que chamou a atenção da McKinsey é que mudou o olhar das empresas sobre a sustentabilidade. Os motivos para adotá-la na gestão estão ligados a eficiência operacional (33% das respostas este ano, contra 19% em 2010). Já para 27% dos executivos, a sustentabilidade representa novas oportunidades de crescimento, contra 17% das respostas obtidas em 2010.

Com respeito às práticas que estão sendo efetivamente adotadas pelas empresas, 63% dos executivos responderam que estão reduzindo o uso de energia elétrica; 61% evitam o desperdício de materiais; e 43% afirmam ter diminuído as emissões de gases de efeito estufa dos processos produtivos.

Questões ligadas a marca e reputação foram muito pouco votadas, o que indica, na observação da MacKinsey, que as empresas estão cada vez mais distantes da adoção de medidas de sustentabilidade por motivos de marketing. A tendência mostrada na pesquisa de 2011 é que o tema está entrando de vez no cerne da gestão do negócio, mas apenas pelo viés ambiental. Impactos sociais e questões relativas à ética e integridade nos negócios. Esses dois eixos também fazem parte da sustentabilidade.

As respostas dos brasileiros

Noventa empresas brasileiras responderam o questionário da McKinsey. Um terço delas encara a sustentabilidade como oportunidade de negócios; 3% a considera um risco. Essa resposta destaca o Brasil dos outros países, uma vez que, lá fora, a tendência dos negócios é avaliar a sustentabilidade tanto como “oportunidade perigosa” quanto como “risco oportuno”. Ou seja, os empresários brasileiros estão menos receosos, na opinião da McKinsey. Alguns fatores podem explicar essa atitude. Um deles é a abundância de matérias-primas. Outro é o pequeno risco de faltar água do país (se comparado com outras regiões do planeta).

O fato é que as empresas brasileiras passaram a enxergar a sustentabilidade como uma alavanca para a geração de valor. Por isso, no Brasil, o movimento em prol da sustentabilidade ganha cada vez mais importância no cenário mundial.

O grande capital natural do país é uma vantagem comparativa que permite aos executivos brasileiros olhar o futuro com mais otimismo. No entanto, essa mesma abundância traz a dificuldade de tratar o tema da escassez de recursos com a necessária urgência para transformar a vantagem comparativa em vantagem competitiva.

O Brasil dorme no berço esplêndido do potencial e não lida com a escassez de recursos já próxima – 2020.

Até esse ano, mais três bilhões de pessoas vão deixar a pobreza e serem incluídos na classe média mundial, consumindo cada vez mais esses já escassos recursos. Por enquanto, o mercado tem regulado a demanda. Mas, o preço alto não será suficiente para reduzir a demanda. A atividade agrícola, por exemplo, tem pouco espaço para expandir. Hoje, há 1,6 bilhão de hectares ocupados pela agricultura. O limite de uso sem causar conseqüências negativas é de 2 bilhões de hectares.

É preciso agir

A pesquisa citada mostra que se a consciência avançou. Mas as ações de liderança, por parte das empresas e dos governo ainda estão aquém do potencial existente.

Nesse sentido, a Rio+20 apresenta-se como uma excelente oportunidade para o exercício dessa liderança. Empresas e governos podem assumir, em conjunto ou individualmente, compromissos mais fortes no rumo do desenvolvimento sustentável. Por exemplo: comprometer-se a adotar padrões mínimos de operação por parte das empresas estatais e daquelas brasileiras que também operam em outros países,

Outro exemplo de compromisso necessário para a liderança brasileira: investir pesado em inovação. E aí temos uma boa notícia: o Ministério da Ciência e da Tecnologia pretende instalar parques tecnológicos nas regiões mais biodiversas do país, para agregar valor à biodiversidade. Seria o “vale do silício da biodiversidade”. Seria ótimo poder dar a notícia do início da construção desses parques já na Rio+20.

A idéia é desenvolver potencial de cada produto sem derrubar floresta. Na Amazônia, por exemplo, já foram identificados 300 produtos com reconhecido potencial, mas o Brasil só usa comercialmente seis: guaraná, açaí, castanha, cupuaçu, graviola e látex, conforme notícia veiculada pelo jornal Valor de 6/10/2011.

Um exemplo do que o país perde é dado pelo açaí. Aqui, é vendido como suco ou sorvete e tem algumas aplicações em cosméticos. Nos EUA, o fruto vira 20 produtos diferentes, do tradicional suco até fitoterápicos e suplementos alimentares.

Se não houver investimento em inovação, o país continuará a ser exportador de matéria-prima e só.

A idéia é que esses parques tecnológicos ajudem a desenvolver uma indústria que dê empregos, crie renda e gere desenvolvimento. Sem derrubar floresta.

O Brasil precisa inverter as suas prioridades. Por enquanto, comporta-se como um herdeiro rico que gasta a fortuna sem se preocupar com o futuro, achando que ela vai durar para sempre. Um exemplo dessa atitude é a permanência de uma a´rea totalmente desmatada e abandonada de cerca de 200 mil km2.

Empresas, governos e sociedade precisam adotar outro modo de vida: de usar a riqueza de hoje para gerar mais riqueza, lembrando que nosso maior diferencial é a economia do conhecimento natural.

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quarta-feira, 5 de outubro de 2011

“Entendendo as lacunas dos sistemas de integridade no Brasil”

O Instituto Ethos lançou ontem, em Brasília, os resultados preliminares de uma pesquisa realizada pelo Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sobre os sistemas de integridade nos Estados brasileiros.

O lançamento fez parte do seminário “Fundamentos para a Prevenção e o Combate à Corrupção”, que marcou o encerramento do Convênio Mobilização do Setor Privado pela Integridade e pelo Combate à Corrupção, entre a Coordenadoria-Geral da União (CGU), o Instituto Ethos e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o qual vigorou entre abril de 2009 e julho de 2011.

Contando com a participação de representantes das três entidades e também do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea), do Ministério do Planejamento, do Ministério Público Federal, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Procuradoria Geral da República, o seminário também discutiu uma nova lei para as compras públicas no Brasil. As reflexões dessa parte do seminário foram transformadas em propostas a serem encaminhadas ao projeto Jogos Limpos, a iniciativa do Instituto Ethos que visa mobilizar a sociedade por maior controle nos orçamentos e gastos públicos nos megaeventos esportivos que vão ocorrer no país entre 2014 e 2016.

O que é a pesquisa

Denominada Sistemas de Integridade nos Estados Brasileiros, a pesquisa é produto do convênio Ethos-CGU-UNODC recém-encerrado e avalia os mecanismos de proteção contra a corrupção nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal. Ao apontar potenciais fraquezas nesses mecanismos, os realizadores esperam que a pesquisa sirva de instrumento de ação política para um planejamento dos diversos setores da sociedade e do governo que atuam como defensores da ética e da integridade em nosso país.

Há mais de duas décadas, a corrupção é assunto recorrente na vida política do país. Talvez por isso, a consciência da sociedade a respeito dessa prática vem se refinando ao longo dos anos. Aquilo que na década de 1980 era percebido como falha moral de determinados indivíduos foi sendo objeto de reflexões mais profundas por parte dos brasileiros até chegar ao estágio atual de consciência sobre o fenômeno: trata-se de um problema sistêmico que vai muito além do moralismo.

A corrupção não é somente o problema de algumas (ou muitas) pessoas mal-intencionadas. O combate a ela depende, em grande parte, dos arranjos institucionais, especificamente das leis que regem a gestão dos recursos públicos, e dos mecanismos de controle por diferentes instituições públicas, em combinação com uma mídia independente e uma sociedade civil vigilante.

Considerando o modelo federativo do Estado brasileiro, é fundamental analisar o sistema de integridade nos poderes de administração em âmbito estadual/provincial e local/municipal. É, muitas vezes, nessas esferas institucionais que ocorre a corrupção, que não é um fato do Poder Executivo central, mas de todo o arcabouço de Estado, quando o “sistema” não funciona.

Veja a seguir as principais conclusões do estudo Sistema de Integridade nos Estados Brasileiros.

Parâmetros do estudo

Foram selecionadas oito áreas para análise: execução orçamentária; modalidades das licitações de bens, serviços e obras; institucionalização de controle interno; independência dos colegiados dos Tribunais de Contas; força da oposição nas Assembléias Legislativas; desenho legal e desempenho prático das comissões parlamentares de inquérito para investigar irregularidades; participação da sociedade civil nos conselhos de gestão; e imparcialidade da mídia local no acompanhamento de casos de corrupção nos Estados.

Sobre cada uma dessas áreas foram aplicados quatro indicadores: acesso à informação; interface público-privada nas compras e licitações; controles internos na administração estadual; e independência dos tribunais de contas estaduais.

Também foi lançado um olhar sobre a mídia e a sociedade civil. Foram comparados os desempenhos dos principais jornais de cada Estado quanto à imparcialidade na cobertura das instituições estaduais. E, no que diz respeito à sociedade civil, a institucionalização e a independência dos conselhos de gestão instalados para fiscalizar o repasse de recursos públicos federais aos Estados.

Eis algumas das principais conclusões:
• Os dados coletados da saúde e da educação revelam um quadro preocupante. Nas áreas selecionadas, as modalidades menos competitivas de contratação pelo Estado (dispensa e inexigibilidade) são responsáveis por 57% do volume de contratações, em média. No Pará, em Minas Gerais, no Espírito Santo e em São Paulo, o quadro é mais preocupante, com taxas de dispensa e inexigibilidade de 61%, 62%, 67% e 75%, respectivamente.
• Embora 85% dos órgãos estaduais de controle interno tenham sites próprios ou vinculados ao portal do governo, apenas 52% disponibilizam relatórios de atividade (on-line ou off-line).
• No controle pelos tribunais de contas, um dos resultados surpreendentes é o não cumprimento, na maioria deles, da regra constitucional de preencher duas das sete vagas com conselheiros provenientes dos quadros técnicos do próprio tribunal. Acre, Alagoas, Mato Grosso, Sergipe e São Paulo não tiveram nenhuma das duas vagas preenchidas dentro dos padrões constitucionais, enquanto Amapá, Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Roraima e Rio Grande do Sul cumpriram parcialmente a norma. No TCE do Amazonas, não foi possível coletar a informação sobre o cumprimento da meta.
• A força da oposição nas assembleias legislativas é bastante reduzida diante do poder de atração que o governo eleito exerce sobre os deputados estaduais. Em oito das 27 unidades federativas, a coalizão que venceu as eleições para governador obteve maioria também na assembleia legislativa. Após a formação do governo, esse grupo cresceu para 21 Estados. Desse grupo, em sete a oposição foi reduzida a menos de 30%, em dois a menos de 20% e em outros dois a menos de 10%.
• A mídia nos Estados apresenta resultados medíocres para o nível de independência de redes de comunicação (televisão e jornais) em relação a grupos políticos regionais.

O estudo permite à sociedade brasileira refletir com profundidade sobre temas que vão além da corrupção. O avanço da própria democracia depende das soluções de participação e controle social que os brasileiros consigam institucionalizar.

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