segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Desigualdade é fator que limita bem-estar da sociedade

O crescimento econômico já não pode ser o principal mecanismo para melhorar a qualidade de vida do ser humano

Muito já se discute sobre os limites do crescimento econômico em contraposição aos recursos oferecidos pelo planeta. Ao mesmo tempo que tirou milhões pessoas da pobreza, elevando-as ao patamar de consumidores, o ritmo incessante no aumento do PIB dos maiores países emergentes, nos últimos anos, também trouxe uma nova reflexão: será possível suportar o padrão de consumo das sociedades ricas ou é necessário criar um novo padrão?

Agora, outras discussões bastante pertinentes vêm juntar-se à primeira questão: padrão de consumo pode ser visto como sinônimo de qualidade de vida e bem-estar? É possível melhorar o bem-estar sem crescimento ou ampliar a qualidade de vida sem que isso represente aumento no consumo?

A lógica econômica sempre colocou o crescimento, com o conseqüente aumento de renda, como uma solução em si mesma para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Mas uma série de economistas começa a discutir com mais profundidade a adoção de um modelo de desenvolvimento sustentável a ser levado em conta num futuro imediato.

Um exemplo desse movimento pode ser visto no livro O Que os Economistas Pensam sobre Sustentabilidade, organizado por Ricardo Arnt, que reúne depoimentos de 15 renomados economistas brasileiros e sua visão sobre o tema. Há entre eles o consenso de que é necessário ampliar e evoluir na qualidade dos debates sobre sustentabilidade e desenvolvimento sustentável.

Um dos economistas participantes do livro acaba de fazer uma interessante reflexão sobre o assunto. Em artigo publicado na última sexta-feira, no jornal Valor Econômico, André Lara Rezende coloca em xeque a visão tradicional da economia de que, se a economia crescesse e a renda aumentasse, todos os demais indicadores de bem-estar estariam contemplados. Segundo ele, para as pessoas de renda mais baixa, a equação crescimento econômico e qualidade de vida se harmoniza perfeitamente, já que a ausência de uma renda que poderíamos chamar de básica impossibilitaria garantir qualidade de vida e bem-estar. Mas, quando a renda passa a contemplar as necessidades básicas, seu aumento não irá significar automaticamente uma melhoria na qualidade de vida.

Para fazer essa afirmação, Lara Rezende baseou-se num estudo realizado por dois médicos infectologistas ingleses, Richard Wilkinson e Kate Pickett, que publicaram um livro intitulado Spirit Level. Para os autores, a partir de um determinado nível de renda, a redução das desigualdades contribui mais para o bem-estar geral do que o simples crescimento econômico. Até mesmo o aumento na expectativa de vida não mais ocorre a partir de um determinado nível de renda. Uma controversa equação que contrapõe renda e bem-estar.

Essa conclusão parece bem interessante e podemos até mesmo constatar sua veracidade em uma situação vivida aqui no Brasil pelas nossas denominadas classes privilegiadas. Podemos observar pessoas vivendo em condomínios fechados, contratando seguranças privados, andando em carros blindados. Essa constante preocupação com a segurança estaria reduzindo o bem-estar proporcionado por uma boa renda.

Os médicos ingleses concluem em seu livro que a desigualdade de renda está diretamente associada à piora de indicadores de bem-estar e acaba por causar menor expectativa de vida, aumento na incidência de doenças, maior taxa de homicídios e até mesmo, dizem eles, um incremento da delinqüência juvenil e da gravidez adolescente.

Claro que os indicadores de bem-estar tendem a ser piores para os mais pobres, mas, quanto mais extremas forem as desigualdades, piores serão esses indicadores, e não apenas para os pobres, mas também para os ricos.

Portanto, como eles afirmam, a desigualdade social interfere diretamente no alcance da felicidade. Uma sociedade em que haja menos pobres será uma sociedade mais feliz. Simples assim!

O estudo conclui que a redução nos níveis de desigualdade melhora a vida dos mais pobres, obviamente, mas também contribui para melhorar a daqueles com renda mais alta. Pois proporciona, entre outros avanços, a diminuição dos conflitos e da tensão latente ocasionados por grandes diferenças sociais.

Essa análise vai ao encontro do que discutimos em 17/1, aqui mesmo, neste espaço da CBN, quando falamos da dificuldade das empresas em se comunicar com a nova classe média beneficiada pela migração social dos últimos anos no Brasil. Na ocasião, afirmamos que quebrar paradigmas, vencer preconceitos e buscar os caminhos de um desenvolvimento mais sustentável são bandeiras defensáveis do ponto de vista moral, mas também são condições sine qua non para o futuro dos negócios. São mudanças que beneficiam a todos, empresários, consumidores, enfim, todos os cidadãos brasileiros.

Longe de situar essa análise como um libelo anticapitalista ou até mesmo socialista, o que André Lara Rezende levanta em seu artigo é o limite de satisfação das pessoas proporcionada pelo crescimento econômico. Ele acredita ser possível transitar para uma sociedade menos consumista e mais igualitária sem com isso comprometer o dinamismo de uma economia de mercado ou interferir nas liberdades individuais.

O certo é que, se formos capazes de construir um mundo mais equilibrado, justo e sustentável do ponto de vista social e ambiental, com certeza teremos a chance de garantir uma melhor qualidade de vida para todos os habitantes do planeta.
Temos convicção que, se mais economistas participarem com seriedade do debate, colocando a sustentabilidade no centro das discussões, teremos um aumento significativo da massa crítica, o que será vital para encontrarmos bons caminhos que apontem para um futuro mais desejável.

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